Mães que trabalham: como ser mãe e melhor profissional

Mães que trabalham

Irrita-me um bocado quando as pessoas assumem que as mães que trabalham querem/conseguem empenhar-se menos no trabalho. Nenhuma das duas tem de ser verdade (embora qualquer uma das duas seja legítima). No outro extremo, já vi pessoas a assinalar as licenças de maternidade no LinkedIn, como se fosse um estágio profissional.

A verdade é que, da minha experiência, e da de muitas mulheres que conheço, ser mãe é uma espécie de superpoder. É cansativo. Exige adaptação. Mas ganha-se mais do que se pensa, incluindo no que se refere a capacidades transferíveis para a vida profissional.

Claro que uma mulher que não seja mãe não é pior profissional, não é disso que se trata. Simplesmente, ser mãe é uma experiência potente e, como qualquer experiência potente da nossa vida, transforma, enriquece e faz crescer. É mais um exemplo de que nem sempre temos de comprometer uma prioridade em função de outra. Há prioridades que se reinforçam mutuamente.

Mães que trabalham

Não é fácil o mundo das mães que trabalham. Há estudos e estudos que mostram o quanto o trabalho da maternidade ainda sobra para as mulheres. Há estudos sobre como a pandemia acentuou o esforço exigido às mães, que ainda são as principais cuidadoras na maior parte dos casos. Já para não falar de todas as coisas que são, à partida, mais difíceis para as mulheres, mães ou não (ando de olho neste livro).

Não esqueças isso, porque não quero que os pontos que se seguem apenas glorifiquem a experiência das mães que trabalham. Aposto que a maior parte de nós, às vezes, se fecha numa casa-de-banho qualquer, em casa ou no trabalho, a chorar. A sentir que está a falhar em todos os tabuleiros. Faz parte e custa. E sinto que estar sempre a passar a mensagem de que “tudo se faz, tudo se faz” pode ser redutor.

Então, falemos das dificuldades. Mas falemos também dos superpoderes que sinto em mim e nas mães com que me encontro por aí. Porque eles existem.

Mães que trabalham: como ser mãe melhora o desempenho profissional

Estive a pensar sobre isso e há uma série de coisas que faço enquanto mãe que tenho a certeza que melhoram o meu desempenho profissional. E não é uma coisa estática. Ser mãe de uma criança de dois anos é diferente de ser mãe de um adolescente. Podemos ter dois filhos e aprender coisas totalmente diferentes com cada um. Por isso, o que se aprende evolui, varia.

Aqui fica uma lista de alguns dos principais pontos em que ser mãe tem melhorado o meu lado profissional.

Relativizar

Esta foi umas primeiras coisas que ser mãe me fez sentir: há muitas coisas que perdem importância. Tudo o que nos faz relativizar aquilo que deve ser relativizado é valioso. Dar demasiada importância nunca é bom. Ir trabalhar como se fosse um tudo ou nada, só empata. Uma pessoa fica tensa, em vez de ficar fresca para os desafios. Relativizar significa não baixar os braços quando a reunião não foi perfeita, quando outra pessoa foi promovida ou quando não se descobriu o sentido da vida numa folha de Excel.

Lidar com imprevistos

É como agora se diz por aí: “Não há como”. Não há como ser mãe e garantir que tudo corre de acordo com o que planeámos. Essa é uma das belezas perversas da coisa: não podemos controlar tudo. Mesmo se tentarmos. E isso faz com que tenhamos de nos render, por vezes. Podemos fazer “tudo bem” e alguém apanha uma virose. Um cocó inesperado que sai para fora da fralda quando se está a chegar a um almoço de amigos. A véspera de um dia importante em que ninguém dorme. Há que lidar. E lidar com imprevistos é um talento cada vez mais útil no mundo do trabalho. Tudo muda a uma velocidade cada vez maior. Saber lidar é triunfar.

Eficácia

Há quem venha logo manifestar a sua preocupação com a produtividade das mães que trabalham. Não deviam. Não conheço nenhum caso em que uma mulher regressada de uma licença de maternidade não seja 10 vezes mais eficaz do que era antes de ser mãe, mesmo que já o fosse. Há uma capacidade de focar e “despachar trabalho” que se acentua mesmo quando o cansaço aumenta. Há uma menor tolerância para momentos do dia em que se está a perder tempo, mesmo que por vezes se sacrifique outras coisas. E depois, todos os outros itens desta lista (planeamento, prioritização, delegação) contribuem para criar verdadeiras máquinas de despachar trabalho.

If you want something done, ask a busy person.

Benjamin Franklin

Planeamento

Ser mãe é ter, pelo menos, mais uma agenda sob gestão. E isso exige planeamento. Antecipar quando vão calhar as consultas da pediatra, quando é preciso comprar pijamas de Verão ou fazer uma figura do presépio de papel higiénico para a escola (true story). E se ainda há sopa para o jantar, ou roupa lavada. Ou quando vai ser instrumental ter um pacote de bolachas Maria ou um boneco da Patrulha Pata na carteira. E tudo isso é treino. O treino cansa, mas às tantas torna-se natural. E não te passa pela cabeça não planear as reuniões importantes ou saber o que vai ser preciso em cada contexto. E é o que faz a diferença, muitas vezes.

Negociar

Uma mãe habitua-se a negociar em casa por uma questão de sobrevivência. Foi surpreendente ver que, antes de saberem falar, os miúdos percebem bem quando se diz “pode beber sumo depois de comer a sopa”. Eles podem nem gostar mas aceitam aqueles princípios básicos da negociação. Eles percebem quando os pais apresentam a sua “melhor oferta”. Eles entendem as cedências e compromissos. Eles sabem o que é um desfecho “win-win”. Eles são negociadores natos e eu pratico todos os dias tácticas cada vez mais sofisticadas.

Prioritizar

Uma coisa evidente para todas as mães que trabalham: o tempo não estica para tudo o que queremos. Mesmo que não se durma, não dá. Alguma coisa cai pelo caminho. E não é só isso, é que há coisas que têm horários específicos. Se não estiver em casa antes das 21h, não vejo os meus filhos acordados. Se não bloquear a festa de Natal às 16h, não vale a pena libertar tempo às 18h. Por isso, tem de se fazer escolhas e as escolhas começam por pensar o que é que não quero sacrificar. E isso é feito todos os dias e quando passamos a prioritizar também as nossas tarefas no trabalho, é um novo mundo que se abre.

Delegar

Numa família, como numa empresa, aquela pessoa que quer fazer tudo sozinha, que acredita que as coisas só ficam bem feitas se for ela a fazer, que não usa a ajuda que tem e que se sacrifica inutilmente, acaba por prejudicar todos. Ninguém ganha e todos perdem de diferentes maneiras. Por isso, a maior parte das mães que trabalham percebe cedo que tem de delegar tarefas. Aquelas que são mais fáceis de delegar, aquelas para as quais não tem tanto jeito ou aquelas que não lhe dão prazer nenhum. Isto varia de mãe para mãe. Mas mostra-me uma mãe que não delega nada, em casa e/ou no trabalho, e eu mostro-te uma mulher prestes a rebentar.

Empatia

Ser mãe é um exercício permanente de empatia. Sobretudo nos primeiros anos, em que nós temos quase de “ser” os nossos filhos. Perceber quando estão com fome, ou com sono, ou com cocó. Ou desanimados, ou orgulhosos. É incrível. E, em princípio, é muito mais natural do que num contexto profissional. Por isso é que é um treino valioso. Uma liçãozinha diária de humanidade. E eu acredito que a humanidade no trabalho é uma mais-valia. Pelo menos no longo-prazo. E quero acreditar que não estou enganada.


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E tu? Como achas que muda o desempenho profissional de mães que trabalham?


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1 comment

  1. Francisca.
    Li e reli todos os itens deste tema e apreciei bastante.
    Muito obrigada.
    Termino com a frase:
    “O limite da visão é o ponto de partida da imaginação”

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