Como lidar com a morte de alguém que amamos

lidar com a morte

Um disclaimer: eu também não sei como lidar com a morte de alguém que amamos. Nesse sentido, este post tem mais dúvidas e tentativas do que respostas certeiras. Não sei dizer-vos como lidar com a morte com a mesma assertividade com que faço sugestões concretas para lerem mais livros este ano. Ainda por cima, sou uma principiante nisto de perder entes queridos.

Mas a morte de alguém que amamos é um processo tão confuso, avassalador e, em muitos casos, solitário, que eu senti que o meu contributo pode ser pelo menos uma companhia para quem passar por isto.

A morte é um bicho esquisito.

Lidar com a morte

A minha Avó morreu no início do ano.

Tinha 93 anos e, tirando a idade e coisas menores, estava óptima. Falávamos ao telefone todos os dias e só não estávamos mais vezes juntas porque eu não ia lá. Falei com a Avó ao telefone menos de 3 horas antes de morrer. Estava a planear estarmos juntas nesse fim-de-semana e a conversa demorou 1min e 48 segundos de acordo com o meu telemóvel, porque eu tinha de ir deitar os bebés.

O que eu quero dizer é que a Avó tinha 93 anos, mas foi altamente inesperado. Quando a minha Mãe ligou a dar a notícia e percebi que alguma coisa se passava, primeiro pensei no meu Pai, depois no meu irmão e só em terceiro lugar me ocorreu que pudesse ser a minha a Avó.

Confrontada com esse choque, fiz o que faço sempre que tenho um problema: abri um livro. Comecei pelo O Ano do Pensamento Mágico, da Joan Didion. Achei que só ia conseguir lê-lo quando estivesse no mood certo. E estava.

Nesse livro, a escritora descreve o ano que se seguiu à morte do marido e de como o seu fluxo de pensamento era tão “mágico”.

I was thinking as small children think, as if my thoughts or wishes had the power to reverse the narrative, change the outcome.

The Year of Magical Thinking, Joan Didion

O que é que a dor da perda faz ao nosso corpo?

Não foi uma invenção da Joan Didion. Há muitos estudos sobre isto. A dor da perda influencia o funcionamento do nosso corpo e do nosso cérebro.

Não fiz uma grande pesquisa. Mas, pelo que percebo, podemos ter imensos sintomas físicos, desde alterações de apetite e dores de cabeça até menor imunidade ou maior probabilidade de ter um ataque cardíaco.

Também no cérebro, de acordo com estudos recentes, notam-se efeitos desta dor da perda em circuitos neurológicos relacionados com estado de espírito, memória, percepção, conceptualização e na regulação do funcionamento de outros órgãos. E tanto pior quanto mais nos afundamos em pensamentos negativos. No limite, pode descambar em depressão.

Como a dor da perda se reflecte nas emoções: as 7 fases da perda

As fases da perda foram celebrizadas neste livro Dra. Elisabeth Kübler-Ross. Acaba por ser reconfortante pensar que a dor da minha perda não tem nada de especial. Todos passamos por reacções “normais”.

As 7 fases incluem as seguintes:

  • Shock
  • Denial
  • Anger
  • Bargaining
  • Depression
  • Testing
  • Acceptance

Eu não sei bem por que fases passei em cada momento. Por um lado parece que passei por elas em menos de 2 dias, até ao funeral. Por outro, ainda estou a passar por coisas. Hei-de estar algures por ali.

Como fazer o luto?

Isto é muito importante. Tenho a convicção de que é mais saudável estar profundamente triste uns dias, do que andar por aí atarefada a fingir que não se passou nada. Mas há pessoas que lidam de forma diferente.

Cada um faz o luto à sua maneira. Chorei muito durante uns dias. A certa altura, não sabia se ia parar de chorar. Perguntei à minha Mãe quando tinha deixado de sentir aquela ausência da mãe, minha outra Avó, que morreu há três anos. “Ainda sinto. Ainda outro dia, ia ligar a dizer que já tinha chegado a casa.”

E é aí que a morte de alguém que amamos mais dói: fica um buraco no sítio que a outra pessoa preenchia nas nossas vidas. Nos telefonemas, nos almoços, nas novidades, nas festas, nas fotografias, no que for.

E depois, toda a nossa humanidadezinha atrapalha também. Culpamo-nos porque podíamos ter feito mais. Passamos um dia sem pensar na pessoa e sentimo-nos culpadas. Lembramo-nos de repente de uma coisa que era para fazermos juntas e que nunca chegámos a fazer. Nada contribui.

A importância dos rituais

Chorei muito, mas a verdade é que, quando chegou a parte do cemitério, alguma coisa parecia que estava a chegar ao fim. A um fim qualquer.

Talvez o papel dos rituais seja esse. Dar-nos alguma estrutura à volta da qual podemos ir seguindo caminho.

O que dizer a alguém que está a lidar com a morte de um ente querido

A maior parte das pessoas fala por bem. Quer ser agradável. Só que somos desajeitados e o tema da morte ainda atrapalha mais.

Muitas pessoas me repetiam, por bem, que a minha Avó não passou por uma doença prolongada, que morreu em casa, que teve uma vida cheia, que eu lhe dei a alegria de 2 bisnetos. Tudo verdade mas tudo inútil no momento. Ou seja, se eu fizer um esforço para pensar sobre isso, reconheço que foi uma sorte. Mas não me pára as lágrimas.

A Sheryl Sandberg tem um livro em que fala sobre isto. O que dizer a quem sofreu uma perda. E também como continuar a viver depois da adversidade. Talvez seja um dos próximos a ler. Ela também perdeu o marido. Yikes.

Como lidar com a morte de alguém que amamos?

O que é que uma pessoa faz?

Para já, tenta acreditar que um dia não vai doer tanto. Que o tempo ajuda.

As coisas que me têm ajudado, na verdade, são arbitrárias e não constituem uma lista que se recomende a ninguém. Ter dois filhos bebés é uma forma muito eficaz de nos desfocarmos da tristeza. Porque temos de limpar rabos ou fazer uma coreografia do Baby Shark. O pior é quando eles adormecem. Ou quando aparecem a cantar “brilha brilha lá no céu, a estrelinha que nasceu”.

Outras coisas não recomendáveis que até ajudam a seguir com a vida incluem estar cheia de trabalho. Ou ter uma situação urgente para resolver. Estas coisas ajudam porque ocupam a parte do cérebro que só quer pôr-se em posição fetal e chorar. Obrigam-nos a continuar com a vida.

Pensamento mágico

E, por fim, ter fé tem-me ajudado muito. Não me tira as saudades da Avó. Mas dá-me uma certa tranquilidade pensar que está num sítio melhor.

Durante a missa do funeral, ouvi a Avó a falar comigo. Eu sei que não ouvi, mas estava a “ouvir”. Era a voz da Avó alegre, talvez mais nova, quase divertida. Chamava-me. Vinha de cima. Olhei para o tecto e a Avó disse-me que já estava no Céu.

It occurs to me that we allow ourselves to imagine only such messages as we need to survive.

The Year of Magical Thinking, Joan Didion

Afinal, a fé também pode ser considerada uma forma “mágica” de pensar. Mas é útil. Palavra de honra que não sei como é que as pessoas sem fé lidam com a morte.

Como honrar a memória de alguém que morreu

Ainda choro, muitas vezes, à noite ou em momentos de pausa durante o dia. Tenho saudades da voz e das gargalhadas da Avó.

Mas tenho andando a pensar muito nisto. Talvez o melhor que cada uma de nós pode fazer seja usar estas recordações como um lembrete. De que ainda estamos vivas. De que devemos estar aqui a 100%, a fazer o que temos a fazer.

E depois, se eu me esforçar muito, um dia encontramo-nos no Céu.



E tu? Já perdeste alguém importante? O que te ajudou a lidar com essa perda?


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